sábado, 20 de janeiro de 2018

Comentário sobre o debate envolvendo a Embrapa
Antônio Salazar P. Brandão
O recente debate envolvendo a Embrapa é oportuno. Traz à luz questões importantes para o futuro da empresa e sua relação com o setor produtivo. Motivado por observações feitas por diversas pessoas e cuja origem foi artigo recente do Prof. Zander Navarro no jornal o Estado de São Paulo, faço a seguir comentários sobre alguns aspectos do tema que é muito amplo.

De início reafirmo o que todos sabem: a Embrapa é uma grande empresa e sua contribuição para o avanço da agricultura brasileira é inegável. É exatamente pela grandeza e maturidade científica desta empresa que me aventuro a fazer as observações que se seguem.

Gostaria de dar destaque à dualidade (na verdade, heterogeneidade) da agricultura no país. Apesar dos grandes aumentos de produtividade das últimas décadas a maioria dos estabelecimentos agrícolas ainda têm produtividade e rentabilidade relativamente baixas. Estes estabelecimentos são responsáveis por pequena parcela da produção agrícola brasileira, conforme mostram pesquisas feitas por profissionais da própria Embrapa. A maioria destes estabelecimentos é composta por agricultores comerciais – enfatizo, agricultores comerciais – os quais têm desafios específicos que precisam ser conhecidos e enfrentados para que possam atingir patamares de produtividade mais elevados. Esta é uma importante fonte para o crescimento da agricultura nos próximos anos e a Embrapa pode contribuir de forma decisiva para atingir este objetivo. Aqui talvez deva estar um dos novos focos estratégicos da empresa.

A descentralização das decisões é um aspecto importante para que os desafios do setor façam parte efetiva do processo de alocação de recursos para pesquisa. Certamente em um país com a dimensão territorial do Brasil é necessário que a empresa tenha braços regionais, porém é necessário também não perder de vista que a efetividade da pesquisa científica exige massa crítica de pessoas qualificadas que, através da interação e da discussão técnica, possam garantir a qualidade de projetos e posteriormente dos resultados encontrados.

Os centros de pesquisa regionais devem ser em número suficiente para tratar a diversidade de ambientes produtivos, mas ao mesmo tempo devem existir condições efetivas para manter equipes robustas em cada um deles. Encontrar este equilíbrio é essencial. Tenho a impressão que alguns centros regionais foram criados em resposta a demandas políticas locais que não necessariamente se coadunam com os princípios enunciados acima. Analisar esta questão pode aumentar a efetividade da atuação da empresa. Existirão certamente grandes desafios políticos a serem enfrentados.


Acredito que a Embrapa tenha condições de levar adiante a missão de se posicionar frente aos novos desafios da agricultura. Mas acredito também que um processo de avaliação externa seja essencial para que estes desafios sejam vencidos. Alguns dos objetivos desta visão externa seriam: analisar as prioridades de pesquisa diante das oportunidades e restrições para o crescimento do setor, analisar a eficiência da alocação de recursos e analisar a consistência do sistema de avaliação de pesquisadores com as prioridades da pesquisa. A participação de cientistas, ao lado de outros profissionais especializados, é essencial. A experiência internacional é vasta e não pode ser ignorada: do time de avaliadores externos devem participar tanto profissionais brasileiros quanto estrangeiros. Integrantes da cadeia produtiva da agroindústria, os usuários finais dos resultados da pesquisa, também devem participar ativamente deste processo.